Há mais ou menos quatro décadas — praticamente “ontem” no universo da ciência —, a alimentação começou a angariar atenção como fator de influência no surgimento de um câncer. Em pouquíssimo tempo, apareceram evidências robustas de que nossos hábitos, incluindo aí a prática de exercícios físicos, são, sim, determinantes nesse sentido. Hoje, sabe-se que 30 a 50% de todos os tumores podem ser evitados com ajustes no estilo de vida. É muita coisa.
Não à toa, o Fundo Mundial para Pesquisa em Câncer e o Instituto Americano para Pesquisa em Câncer, entidades de peso dedicadas ao enfrentamento da doença, criaram o Relatório de Especialistas, um compilado que reúne comportamentos eficazes contra tumores. A primeira edição do documento é de 2007, a segunda veio dez anos depois e a terceira acaba de ser publicada — as orientações estão nos tópicos abaixo.
Para o farmacêutico e bioquímico Thomas Ong, do Centro de Pesquisa em Alimentos, o FoRC, da Universidade de São Paulo (USP), muitas pessoas ainda têm a impressão de que o câncer é uma doença essencialmente hereditária. No entanto, isso só é verdade em 10% dos casos. “Em 90%, têm tudo a ver com estilo de vida, e como esses fatores chamados de ambientais interagem com o nosso genoma”, esclarece o professor.
Na visão da oncologista Maria Del Pilar Estevez Diz, diretora do corpo clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), um dos grandes desafios para a adesão a uma rotina equilibrada é o reconhecimento de que o câncer pode bater à porta em algum momento. “Há uma tendência em não se pensar nisso”, avalia.
Um segundo obstáculo é que mudar hábitos não é tão simples. Longe disso. “Muitos deles vêm lá da infância”, observa a médica.
Mesmo que o indivíduo tope rever seu dia a dia, a realidade à sua volta às vezes dificulta o processo. “Hoje a legislação trabalhista não colabora para que toda mãe amamente o bebê até os 6 meses de idade”, lembra a nutricionista Luciana Grucci, do Instituto Nacional de Câncer (Inca), citando uma das medidas para barrar o câncer de mama nas mulheres e seus filhos. Contar com alimentação saudável a preço justo, dados nutricionais claros nos rótulos e espaços urbanos para a prática de exercícios são outros desafios.
Ainda assim, vale a pena fazer o que estiver a seu alcance. “Para ter ideia, de 15 a 20% dos cânceres hoje são atribuídos à obesidade”, exemplifica o oncologista Gilberto de Castro Junior, do Hospital Sírio-Libanês, na capital paulista.
No laboratório do professor Ong, está cada vez mais claro que renovar os hábitos agora pode blindar até as próximas gerações contra a doença. “Seria muito melhor se seus pais tivessem pensado em prevenção antes de você nascer”, diz. Mas nunca é tarde para começar. Vamos lá?