Podemos estar mais perto do que imaginamos de um remédio contra a febre amarela. Em vez de tentar desenvolver um tratamento do zero, pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo, do Instituto Butantan (SP) e da Fundação Oswaldo Cruz (RJ), estudaram substâncias já disponíveis comercialmente – e encontraram opções promissoras para debelar essa doença.
Esse tipo de pesquisa funciona assim: a partir de uma espécie de biblioteca de compostos químicos desenvolvidos previamente, os cientistas testam um a um em laboratório para determinar quais teriam maior eficácia contra determinada doença. No caso da febre amarela, os experts brasileiros avaliaram 1 280 moléculas.
Para fazer isso, recorreram a aparelhos de última geração que analisam rapidamente como cada uma dessas partículas reage diante de células humanas infectadas com o vírus. Daquele total de 1 280 princípios ativos, eles chegaram a 88 que inibiam a infecção em pelo menos 50%.
Mas isso não foi suficiente. “Fizemos ensaios confirmatórios para a potência da atividade antiviral e da atividade contra a célula hospedeira”, explica o imunologista Lucio Freitas-Junior, coordenador do trabalho.
Traduzindo, os pesquisadores verificaram se tais moléculas seriam poderosas contra a febre amarela ao mesmo tempo que preservariam a célula humana. Ora, de pouco adianta encontrar uma arma que mata o inimigo se ela extermina você também, não é mesmo?
“No fim, selecionamos os compostos que eram ao menos dez vezes mais potentes contra o vírus em relação às células”, diz Freitas-Junior. De todo esse trabalho, sobraram cinco moléculas com bom potencial de serem usadas como antiviral contra a febre amarela. E um bônus: duas delas também parecem bloquear a ação do subtipo 2 da dengue.
Os próximos passos
Serão necessários mais alguns anos de trabalho para confirmar os achados do laboratório – até por isso os nomes das substâncias não serão divulgados. Em outras palavras, as moléculas selecionadas devem ser aplicadas em seres humanos de carne e osso (e não só em um punhado de células) para verificar se conseguem conter uma infecção de febre amarela, qual a dose necessária e por aí vai.
“De qualquer modo, essa estratégia encurta em muito o tempo de desenvolvimento de um medicamento”, garante Freitas-Junior. É possível que, em três anos, tenhamos opções na farmácia graças a esse esforço brasileiro – pelos métodos tradicionais, passam-se ao menos dez antes que uma nova droga garanta sua eficácia e segurança.
“Esperamos descobrir alternativas de forma rápida para o tratamento de surtos e epidemias, como está sendo o caso de febre amarela agora, como foi com zika no ano anterior e como deve ser o caso de outros problemas que estão por vir, infelizmente”, conclui o expert.
Em comunicado à imprensa, o virologista Paolo Zanotto, do ICB, comemorou a pesquisa de seu companheiro de bancada: “Esse sucesso implica na possibilidade de termos pela primeira vez a capacidade de interferir no processo infeccioso da febre amarela e salvar vidas”. Estamos na torcida!
Enquanto isso, fique atento à vacinação, especialmente se for viajar para áreas de risco.