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Como funciona o novo medicamento contra o colesterol aprovado pela Anvisa

Inclisirana limita a produção de uma proteína do fígado, auxiliando na redução dos níveis de colesterol ruim (LDL) no sangue

Por Lucas Rocha e Simone Blanes
Atualizado em 12 jul 2023, 18h27 - Publicado em 12 jul 2023, 17h53
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Índice de colesterol pode estar ligado ao estilo de vida, como má alimentação, tabagismo, sedentarismo e obesidade (Foto: Sam Moghadam Khamseh/Unsplash/Divulgação)
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Recentemente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o medicamento inclisirana como mais um aliado no controle do colesterol LDL.

O novo remédio, que tem um mecanismo de ação inédito neste contexto, por meio do RNA de interferência, é indicado para adultos com colesterol alto, especialmente aqueles com risco cardiovascular elevado, com histórico de infarto ou de acidente vascular cerebral (AVC).

“Pacientes que já sofreram com ataque cardíaco ou derrame precisam não só reduzir o colesterol ruim, mas controlá-lo com rigor, isto é, mantê-lo abaixo de 50mg/dL”, afirma Raul Santos, cardiologista do Instituto do Coração, do Hospital das Clínicas de São Paulo, e ex-presidente da Sociedade Internacional de Aterosclerose (IAS).

“Manter o LDL nesse patamar é essencial para que um paciente não volte a ter novos eventos cardiovasculares graves, que têm mais risco de acontecerem depois de um primeiro caso”, completa o especialista.

+ Leia também: O que é o colesterol LDL? E o HDL?

Mecanismo de ação

O colesterol contribui para o funcionamento do organismo, especialmente na produção de alguns hormônios e de vitaminas. No entanto, o excesso deste tipo em particular, o LDL, pode ser prejudicial para a saúde.

O fígado é responsável por remover o LDL, conhecido como colesterol ruim, do sangue. Contudo, essa retirada é prejudicada na presença de uma proteína específica nas células hepáticas, chamada PCSK9.

O inclisirana utiliza como mecanismo de ação uma molécula de RNA que limita a produção da proteína e, assim, auxilia na redução do LDL.

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Os RNA são uma categoria de molécula que atua traduzindo a informação do nosso código genético e levando-a às estruturas que fabricam proteínas nas células humanas. São vários tipos envolvidos nesse processo, e talvez o mais o conhecido seja o RNA mensageiro, que está nas vacinas da Covid-19.

Além dele, existe o RNA de interferência. Ao contrário do mensageiro, que ordena a fabricação de proteínas, este interrompe a linha de produção. É essa categoria que é utilizada no novo medicamento.

+ Leia também: A revolução genética

“O princípio ativo inibe a produção da proteína PCSK9, que diminui os receptores hepáticos de colesterol LDL, que o retiram da circulação”, explica Barbara Riquena, diretora médica de cardiologia da Novartis, fabricante do produto.

“Com a ação, os receptores de LDL no fígado se mantêm a todo o vapor, funcionando como ‘goleiros’ que agarram as partículas de colesterol ruim no sangue e as mantêm dentro do órgão, onde serão eliminadas. Desta forma, cai o nível de colesterol LDL circulante”, acrescenta a médica.

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O medicamento é administrado apenas duas vezes ao ano, a cada seis meses, via injeção sob a pele. “Em associação com as estatinas, ele reduz em cerca de 50% o nível de colesterol ruim no sangue dos pacientes”, afirma Barbara.

+ Leia também: Nutrição como aliada no combate ao colesterol

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Maioria do colesterol é produzido pelo próprio corpo, mas a alimentação rica em gordura saturada também influencia nos níveis (Foto: Edward Franklin/Unsplash/Divulgação)

Qual a diferença para os outros tratamentos?

Atualmente, o controle do colesterol é feito a partir do uso de medicamentos, como as estatinas, e de anticorpos monoclonais.

O cardiologista Raul Santos explica que as estatinas basicamente bloqueiam uma enzima, chamada HMG-CoA redutase, responsável pela síntese do colesterol no fígado. Essa ação diminui a concentração do colesterol no órgão e, por consequência, faz com que ele aumente a capacidade de eliminar as partículas LDL circulantes.

Como explicamos, o novo remédio consiste em uma terapia baseada em RNA, focada em reduzir a proteína PSCK9, que atrapalha este trabalho de remoção.

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O raciocínio, no fim das contas, é semelhante: as estatinas, os anticorpos monoclonais e o inclisirana atuam no aumento da quantidade de receptores do colesterol ruim.

A ideia é sempre fazer com que o fígado produza menos e remova mais LDL do sangue.

“É uma terapia muito interessante, por ser focada nessa proteína, e tem uma vantagem grande, que é a aplicação. Diferentemente da estatina, que é tomada todos os dias, ou dos anticorpos monoclonais, que são injetados a cada 15 ou 30 dias, essa injeção tem uma ação muito prolongada”, diz Santos.

Para quem é indicado?

Em pacientes com colesterol alto e alto risco cardiovascular, é necessário manter o controle do LDL muito baixo, com índices inferiores a 50 mg/dL  — o que não acontece para muitos dos pacientes que sofreram infarto.

A meta não é atingível com dieta e exercícios físicos para esses indivíduos, segundo os especialistas. Para eles, é recomendado o uso de medicamentos chamados estatinas, que devem ser tomados por toda a vida.

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“No entanto, mesmo tomando corretamente as estatinas, cerca de 60% dos pacientes não atingem a meta recomendada, permanecendo expostos a um risco muito alto de sofrer um novo ataque cardíaco ou um novo derrame. Para esses pacientes, existe o inclisirana”, diz Barbara.

“Na prática, o medicamento é indicado para todos os pacientes que não conseguem atingir ou se manter nos níveis recomendados de colesterol ruim, mesmo com o uso da dose máxima tolerada de estatina e as mudanças na alimentação e estilo de vida”, acrescenta.

A ideia é que a aplicação do novo composto seja complementar às estatinas. Nos estudos que demonstraram sua eficácia, ele foi usado combinado a elas, não isoladamente.

+ Leia também: Mais de um quarto das crianças e dos adolescentes têm colesterol alto

Quanto deve custar?

Inclisirana ainda não tem um custo definido, de acordo com a diretora médica da Novartis.

“Assim como ocorre com toda nova terapia aprovada pela Anvisa, agora cabe à CMED, Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, definir o preço no mercado brasileiro. Esse processo considera regras definidas na legislação brasileira e pode levar até 90 dias”, detalha.

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O medicamento já foi aprovado pelos órgãos reguladores dos Estados Unidos e da União Europeia. Nos Estados Unidos, o valor de cada injeção flutua na casa dos 3 mil dólares (ou mais de 14 mil reais por dose).

Na indicação, a Novartis destaca o uso do fármaco para pessoas com condições como dislipidemia, definida pela presença de níveis elevados de gordura no sangue, e hipercolesterolemia familiar, doença genética associada ao aumento do colesterol.

“A aprovação do Inclisirana representa uma nova perspectiva de tratamento para essas pessoas, ou mesmo para indivíduos de muito alto risco que tenham outras formas de dislipidemia”, afirma Maria Cristina Izar, diretora da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) e professora livre-docente de cardiologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

Importância do controle do colesterol

Estimativas do Ministério da Saúde apontam que 4 em cada 10 brasileiros têm colesterol alto. O controle é essencial para a prevenção de doenças cardiovasculares, que estão entre as principais causas de morte no mundo.

+ Leia tambémColesterol: esqueceram de mim?

“A hipercolesterolemia aumenta a incidência de infarto e de acidente vascular cerebral. Juntas, essas duas doenças são responsáveis por 20 milhões de mortes por ano no mundo”, afirma Roberto Kalil, presidente do Conselho do Incor e diretor de cardiologia do Hospital Sírio-Libanês.

O especialista explica que os níveis adequados de colesterol variam de uma pessoa para outra, considerando aspectos como idade, peso e condições de saúde. “O importante é que se tem que baixar o colesterol LDL. Para isso, temos dietas, exercícios e remédios convencionais, como as estatinas”, diz.

O consumo elevado de alimentos como carnes vermelhas, ultraprocessados e com gorduras saturadas favorece o descontrole de colesterol. Dietas pobres em frutas e hortaliças também aumentam o risco do surgimento do problema.

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