Entre 2023 e 2025, estima-se que cerca de 73 mil brasileiras serão diagnosticadas com câncer de mama por ano, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA).
Também de acordo com o órgão, 15% dessas mulheres têm menos de 40 anos. A incidência desse tumor em mulheres jovens tem aumentado nos últimos anos e já supera a prevalência de outros países, como os Estados Unidos, que registram apenas 5%.
O cenário levanta novas questões e preocupações. Afinal, qual o impacto do aparecimento de tumores em idade reprodutiva na fertilidade dessas mulheres?
A seguir, especialistas esclarecem as principais dúvidas sobre contracepção, gravidez e menopausa relacionadas ao tema:
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1. Como o tratamento do câncer de mama afeta a fertilidade?
Como acontece em outros tipos de câncer, mulheres diagnosticadas em idade fértil são orientadas a utilizar métodos contraceptivos para evitarem a gravidez durante a terapia.
Em geral, opções hormonais — pílulas, injetáveis, anel vaginal, implantes ou dispositivos intrauterinos (DIU) hormonais — são contraindicadas, pois aumentam o risco de trombose, entre outras alterações.
O uso do DIU de cobre é o mais recomendado a essas mulheres. É um método de longa duração tão eficaz quanto uma laqueadura, mas com o benefício de ter seu efeito revertido assim que ele é retirado do útero, possibilitando a gravidez.
Também ressalta-se a importância combinar seu uso com outros métodos não hormonais, como o preservativo, que também evita infecções sexualmente transmissíveis (IST).
Além disso, mulheres em tratamento contra o câncer de mama podem precisar recorrer à hormonioterapia (também chamada de endocrinoterapia), que também influencia no sistema reprodutor da mulher.
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A técnica consiste em inibir a produção de hormônios associados ao crescimento do câncer em questão. No caso dos tumores de mama, a exposição ao estrogênio é um fator de risco para a recidiva da doença.
Portanto, é pouco provável que uma paciente engravide durante o tratamento oncológico. Além disso, os tratamentos oncológicos podem comprometer a reserva ovariana e isso reduz as chances de engravidar no futuro.
Mas a ciência já está desenvolvendo formas de assegurar a fertilidade de mulheres em idade reprodutiva após a recuperação da doença.
2. É possível engravidar após o tratamento?
Sim, mas nem todas as tecnologias estão disponíveis no sistema público. O acesso a esses procedimentos, portanto, ainda é um desafio a ser superado. Mas as técnicas tem avançado.
“Estamos vivendo um momento brilhante dentro da oncologia. São vários os avanços relacionados à detecção precoce e aos tratamentos, e isso também se reflete na fertilidade da paciente”, comemora Pedro Exman, coordenador do grupo de tumores de mama e ginecológicos do Centro Especializado em Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
Para amenizar o impacto do tratamento no sistema reprodutor, a mulher pode passar um procedimento de congelamento de óvulos antes que as terapias comecem. Esses óvulos podem ser usados posteriormente, quando a paciente estiver recuperada e desejar ter filhos.
Outro avanço recente é a possibilidade de interromper a hormonioterapia para engravidar com segurança, apontada por estudos recentes.
“É uma completa mudança de paradigmas”, afirma Anastasio Berrettini Júnior, coordenador do serviço de mastologia e reconstrução mamária da Hapvida NotreDame Intermédica, em São Paulo. “Toda mulher jovem diagnosticada deve ser aconselhada sobre essas possibilidades.”
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3. O que acontece quando o diagnóstico chega durante a gravidez? O bebê corre risco?
Apesar de raros, alguns tumores podem aparecer durante a gestação ou em até um ano após o parto. É o caso do chamado câncer de mama associado à gravidez ou câncer de mama gestacional, um dos mais comuns nesta fase.
Nesses casos, cirurgias para a retirada de tumores podem ser realizadas em qualquer período da gravidez. Já o tratamento quimioterápico pode ser feito, mas após as 12 primeiras semanas de gestação.
“No primeiro trimestre, deve-se evitar agentes que possam causar malformações e anormalidades ao feto”, explica Berrettini Jr. “Após essa fase, a placenta já estará formada e será capaz de proteger o bebê.”
Outras técnicas, como a radioterapia, não são recomendadas.
O diagnóstico e o tratamento durante gravidez não mudam o prognóstico da paciente e não aumentam o risco de prematuridade do bebê — apesar de alguns médicos preferirem induzir o parto para maior segurança da mãe e do filho.
4. Como deve ser feito o diagnóstico do câncer de mama na gravidez?
Caso a gestante sinta algum nódulo ou alteração inesperada nas mamas, seu médico deve ser consultado.
Nesses casos, o ultrassom costuma ser solicitado para avaliar a queixa e biópsias podem ser necessárias para determinar o diagnóstico. Estes procedimentos não oferecem risco ao feto.
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A realização de mamografia, o principal exame de rastreamento do tumor no seio, não é recomendada durante a gravidez, por conta do risco de exposição do bebê à radiação.
As ressonâncias magnéticas com contraste também não devem ser realizadas, já que a substância pode atravessar a placenta e provocar danos ao feto.
5. Qual é a relação entre câncer de mama e amamentação?
Além de ser muito importante para o desenvolvimento do bebê, o aleitamento materno também traz benefícios à mãe. Um deles é que esse hábito é um fator protetor contra o câncer de mama.
Estima-se que, a cada ano amamentando, a mulher tenha seu risco de ter a doença diminuído em 5%.
Além disso, aquelas que são adeptas e acabam desenvolvendo tumores mamários tendem a ter quadros menos agressivos.
“A amamentação traz benefícios a longo prazo tanto ao bebê como para a mãe, por isso deve ser estimulada”, avalia Berrettini Jr.
6. Qual é a relação entre câncer de mama e menopausa?
A menopausa não tem nenhuma relação com o desenvolvimento do câncer de mama.
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A terapia de reposição hormonal, muito utilizada para aliviar sintomas dessa fase, porém, não é indicada a mulheres que já tiveram a doença.
Isso porque a exposição a hormônios, principalmente ao estrogênio, pode favorecer sua recidiva.
7. Como fica a fertilidade de mulheres com risco genético de ter câncer?
Mutações nos genes BRCA 1 e 2 elevam o risco de desenvolver câncer de mama e de ovário. Como forma de prevenção a retirada desses órgãos pode ser indicada pelos médicos.
Nesse caso, os especialistas devem informar a mulher sobre as opções de preservação da fertilidade disponíveis, caso ela pretenda ter filhos no futuro. Congelamento de óvulos e de embriões são alternativas.
Aconselhamento genético também é fundamental.
8. Métodos contraceptivos aumentam o risco de câncer de mama?
Esta questão gera muito debate entre especialistas.
Algumas pesquisas já associaram anticoncepcionais a um leve aumento no risco de desenvolver a doença na mama. Outras sugeriram que as pílulas diminuiriam a incidência de tumores nos ovários e no endométrio.
Porém, segundo o Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos, a grande maioria desses estudos são observacionais e, portanto, não podem “estabelecer definitivamente que uma exposição – neste caso, a contraceptivos orais – causa (ou previne) câncer”.
Especialistas argumentam que essas pesquisas podem não estar considerando outras questões existentes entre mulheres que usam ou não as pílulas.
“É possível que estas outras diferenças – em vez do uso de contraceptivos orais [por si só] – sejam o que explica seus diferentes riscos de câncer”, afirma o órgão de saúde norte-americano.
Já na cartilha brasileira Câncer de mama: vamos falar sobre isso?, o Inca cita o “uso de contraceptivos orais (pílula anticoncepcional) por tempo prolongado” como um dos fatores de risco para a doença.
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A Cancer Research UK, uma das maiores instituições de pesquisa oncológica do mundo, afirma que “precisamos de mais pesquisas sobre a pílula combinada e o risco de qualquer outro tipo de câncer.”
“Ainda que a pílula já tenha sido associada à doença, é importante esclarecer que os benefícios do método superam os riscos. Ele não deve ser vilanizado”, defende Exman. “Há fatores de riscos mais predominantes”, completa.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os principais fatores de risco para o câncer de mama são:
- Avanço da idade;
- Obesidade;
- Uso abusivo de álcool;
- Histórico familiar;
- Exposição excessiva à radiação;
- Histórico reprodutivo (menarca precoce ou gravidez tardia, por exemplo);
- Tabagismo;
- Terapia de reposição hormonal.