A hipertensão arterial é umas das doenças mais prevalentes e uma das principais causas de morte no Brasil e no mundo. Além das consequências já conhecidas para o indivíduo que não está com a pressão controlada, a pandemia de Covid-19 (causada pela coronavírus) se torna, neste momento, mais um importante risco para esses pacientes.
Segundo relatórios da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde, os hipertensos estão entre os principais alvos de complicações pelo coronavírus. Na China, um estudo feito em Wuhan com pacientes infectados mostrou que 48% das pessoas que morreram tinham pressão alta. O índice de hipertensos caiu pela metade (24%) entre os que se recuperaram bem.
Daí por que os hipertensos merecem uma atenção especial. Eles devem tanto buscar evitar o contágio pelo vírus — medida baseada principalmente no isolamento social — como manter os cuidados habituais para o controle da pressão arterial. E aqui me refiro ao uso regular de medicamentos, dieta equilibrada e prática de exercícios.
Independentemente da idade, por pertencerem ao grupo de risco, os hipertensos devem estar com as vacinas em dia — incluindo a vacina da gripe, que estará disponível para os pacientes crônicos a partir do dia 16 de abril na rede pública.
O aumento anormal da pressão
Mas, afinal, por que a pressão sobe e permanece elevada em determinadas pessoas? Em linhas gerais, os “números” da pressão — medidos em milímetros de mercúrio (mmHg) — são o resultado da força (ou pressão) que o sangue, bombeado a partir do coração, faz ao percorrer as paredes das artérias, que, por sua vez, oferecem certa resistência a esse trânsito. Essa “disputa” determina a pressão arterial de cada indivíduo.
É classificado como hipertenso aquele cuja pressão fica maior ou igual a 14 por 9 na maior parte do tempo. A partir desses números, as chances de a pressão alta provocar doenças cardiovasculares e renais são maiores do que em pessoas com níveis normais.
O primeiro número se refere à pressão sistólica, ou máxima, que registra o momento em que o coração libera o sangue e este tem seu impacto com a aorta, a maior artéria do corpo. O segundo valor é a pressão diastólica, ou mínima, que é dada pela resistência imposta pelos vasos chamados arteríolas. Para considerar que uma pessoa está com a “pressão boa”, a medição deve apontar 12 por 8.
Doença silenciosa
Na maioria das vezes, a hipertensão não dá sintomas. Mesmo a agressão a órgãos nobres como coração, cérebro, rins e olhos pode acontecer sem o paciente apresentar qualquer sinal. Daí a nossa recomendação de que, mesmo na ausência de manifestações estranhas, a pressão seja medida com frequência.
Ainda assim, alguns sintomas podem delatar que a pressão está alta. É o caso de dor no peito, dor de cabeça, tontura, zumbido, palpitações, fraqueza, falta de ar, sangramento nasal e visão embaçada.
Como a hipertensão tem características genéticas, o médico deve ser informado sobre casos na família, especialmente por ascendência direta, como pai e mãe. A idade também influencia, uma vez que, acima dos 60 anos, as artérias vão perdendo a flexibilidade.
Outro fator de risco é a etnia: estudos comprovam que as populações negra e asiática estão mais sujeitas à hipertensão. Obesidade, poluição, estresse, sono irregular, excesso de bebidas alcoólicas, colesterol alto, tabagismo, alto consumo de sal, sedentarismo, diabetes, doenças renais, apneia do sono e hipertireoidismo, além da menopausa, também contribuem para o quadro.
Perdas e danos
A hipertensão costuma chegar sem alardes, mas pode provocar grandes estragos quando não controlada. Com a pressão arterial fora dos parâmetros, o coração tende a ser um dos órgãos mais impactados por conta da circulação sanguínea comprometida. Assim, ele não recebe sangue e oxigenação suficientes, aumentando o risco de um infarto.
O AVC (Acidente Vascular Cerebral) é outro perigo real para os hipertensos. Isso porque as artérias da cabeça, por conta da doença, estão suscetíveis a importantes estreitamentos e rupturas. Além disso, a pressão alta ocasiona pequenas obstruções e hemorragias no cérebro, que chegam a destruir os neurônios e levar à demência e perda da memória.
Insuficiência renal é outra possível consequência da hipertensão descontrolada por longo tempo. A pressão alta ainda interfere nos vasos que irrigam a retina, tecido no fundo dos olhos, podendo causar vista embaçada ou até mesmo perda da visão.
Não há cura, mas há controle
O controle da pressão arterial tende a exigir mudanças no estilo de vida e o uso de remédios. No tratamento medicamentoso entram diversas substâncias prescritas pelos médicos, que ainda podem ser combinadas: diuréticos, vasodilatadores, bloqueadores dos canais de cálcio, inibidores da enzima conversora da angiotensina, bloqueadores do receptor da angiotensina II e betabloqueadores são algumas delas.
Mas, sem dúvida, bons hábitos são o melhor remédio para combater a hipertensão. Exercícios físicos bem orientados, incorporados à rotina — principalmente atividades aeróbicas, como caminhadas, natação e corrida —ajudam na liberação de óxido nítrico, que é um vasodilatador e, portanto, contribui naturalmente para manter a pressão em níveis normais.
Uma alimentação balanceada, com baixo consumo de sal, também é crucial. A Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) recomenda até 5 gramas de sal por dia, ou uma colher de chá. É o limite de consumo, sem esquecer que o sal está presente em boa parte dos alimentos processados, como massas e temperos industrializados, facilmente encontrados na mesa dos brasileiros, mas que deveriam ser evitados.
Nunca é tarde para virar essa mesa! Aproveite o período de isolamento social e promova sua revolução pessoal em prol de uma vida mais saudável.
* Dr. Flávio Borelli é cardiologista, doutor pela Universidade de São Paulo (USP), assessor científico da Socesp e médico assistente da Seção de Hipertensão Arterial e Nefrologia do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (SP)