Sabemos que a pandemia de Covid-19 tem semelhanças com a gripe espanhola, também de alcance mundial e com um impacto devastador. A gripe infectou mais de 500 milhões de pessoas e fez cerca de 50 milhões de vítimas entre os anos de 1918 e 1920.
Atualmente, o novo coronavírus já causou mais de 370 mil vítimas fatais, mais de 30 mil só no Brasil. A semelhança que quero tratar aqui, porém, não é a de quantas pessoas tiveram suas vidas afetadas por essas doenças, mas o fato de que as duas voltaram a atenção da população e de seus governos para o sistema de saúde.
Diante do caos gerado pela gripe espanhola, foi destravado o debate sobre a criação, efetivada em 1919, do Departamento Nacional de Saúde Pública. Novamente, estamos diante de um cenário complexo provocado por uma pandemia e que exige mobilizações e transformações. Daí a importância de um assunto voltar à pauta, a telemedicina, que lutava há muitos anos para ser regulamentada e devidamente estabelecida no Brasil.
Antes da rápida evolução da Covid-19 no país, a telemedicina se encontrava restrita, só permitida em casos específicos e emergenciais, como na emissão de laudos a distância e na prestação de suporte diagnóstico ou terapêutico, e sempre com a presença de um médico junto ao paciente e o especialista, de fato, remotamente. Com a crise do coronavírus, a telemedicina foi regulamentada temporariamente.
Durante a pandemia, estão liberados serviços de teleorientação, telemonitoramento e teleinterconsulta. Também pode ser feita a teleconsulta, ou seja, o atendimento do médico diretamente a distância (sem outro profissional junto ao paciente). Essa liberação é muito importante para reduzir as barreiras de acesso que os brasileiros já vinham enfrentando.
O grande X da questão aqui é que, apesar de toda a tecnologia avançada que já existe à disposição da medicina, grande parte dos profissionais ainda não está capacitada para lidar com esse novo recurso.
Em nosso país, a telemedicina tem andado bem lentamente rumo ao desenvolvimento. Levamos 16 árduos anos para conseguir uma regulamentação que tão logo foi derrubada no ano passado pelo medo do desconhecido e do novo (nem tão novo assim). Hoje, portanto, falta para a telemedicina não mais a atenção, mas, sim, a profissionalização na área.
Se pensarmos no quanto poderíamos ter avançado nesse período, entendo que perdemos um precioso tempo de dedicação e desenvolvimento. Hoje nos faltam profissionais capacitados e tecnologias qualificadas para lidar com o segmento. Além do mais, falta uma visão maior para entender seus pormenores e compreender que ela não só é o futuro, mas também o presente. A tecnologia nos cobra avanços não só em curas e vacinas, mas também na forma de melhor atender aos pacientes.
Apesar de ser uma medida provisória, a liberação da telemedicina pode ser a chance de capacitarmos o sistema e os profissionais de saúde e se reconhecer o papel tão relevante dessa área. E uma oportunidade de inserirmos a telessaúde e a saúde digital no currículo dos universitári@s. Talvez esse seja o momento tão esperado para unirmos forças entre os profissionais da saúde e os da tecnologia da informação para criarmos um panorama de avanços no sistema de saúde, seja ele público ou privado.
Temos em nossas mãos a chance de inserir a telemedicina de vez em nosso dia a dia e criarmos novos procedimentos para aliviar tensões e salvar vidas, sem descuidar da segurança e da integridade das informações e dos acessos e da responsabilidade ética nos atendimentos a distância. A telemedicina se estabelece, assim, como uma grande janela para demonstrar, em tempo real, o conhecimento, a habilidade e a perícia tão fundamentais à promoção integral da saúde.
* Luiz Ary Messina é coordenador nacional da Rede Universitária de Telemedicina (RUTE)