O câncer de pulmão, um dos mais difíceis de tratar, é considerado o mais letal no mundo, levando a mais de 2 milhões de mortes por ano. Por aqui, esse número é de cerca de 30 mil óbitos anualmente, mais do que os cânceres de mama, colorretal e colo de útero combinados – tipos para os quais há programas de triagem e rastreamento populacional, inclusive no Brasil.
Em mais de 25 anos de meu trabalho e estudo sobre o câncer, o que ainda preocupa é o caráter silencioso da doença, que não manifesta sintomas nos estágios iniciais.
Isso e a falta do rastreio como política pública são motivos que fazem com que o câncer de pulmão seja diagnosticado de forma tardia, contribuindo para a alta letalidade.
Para ter uma ideia, 9 em cada 10 casos desse tipo de tumor no Brasil foram diagnosticados em estágios avançados (III e IV) em 2021. Os números impressionam e a detecção precoce é a chave para mudar essa realidade.
A Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos Estados Unidos, por exemplo, recomenda a realização anual da tomografia do tórax com baixa dose de radiação (TCBD) para o seguinte perfil: fumantes ou pessoas que pararam de fumar há menos de 15 anos, com idade entre 50 e 80 anos e com um histórico de 20 “anos-maço” (que fumaram o equivalente a 1 maço por dia durante 20 anos ou 2 maços ao dia durante 10 anos).
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Um estudo realizado na Holanda acompanhou mais de 15 mil pessoas consideradas de alto risco por 10 anos e foi observada a redução de 24% na mortalidade no grupo que fez o acompanhamento com a tomografia computadorizada, em comparação a quem não realizou o exame.
Publicado em 2020, no periódico The New England Journal Of Medicine, o estudo revelou ainda que quase 60% dos diagnósticos de câncer de pulmão foram identificados pela tomografia de rastreio; desses, mais de 58% dos pacientes tiveram o tumor diagnosticado nos estágios mais iniciais. Já no grupo controle, que não fez a tomografia, apenas 13,5% receberam um diagnóstico precoce.
Descobrir para tratar
Felizmente, o cenário terapêutico do câncer de pulmão vem avançando de forma significativa nos últimos anos.
As novas possibilidades de tratamento têm evidenciado ainda mais a possibilidade de cura estar diretamente associada ao diagnóstico precoce – que só é possível com a criação de programas efetivos de rastreamento para a população de alto risco.
A política de triagem do câncer de mama nos mostra que é possível mudar a trajetória do câncer quando se rastreia de forma efetiva. Ainda que silenciosa, sem sintomas, a doença pode estar lá. Faz todo o sentido saber disso o quanto antes para agir.
*Rogerio Lilenbaum é oncologista e vice-presidente sênior do Júpiter Medical Center na Flórida e professor adjunto do MD Anderson Cancer Center no Texas, EUA