Como oncologista, sinto no consultório que o diagnóstico de câncer, embora intimidador, já não causa o mesmo pavor de antes. A palavra “câncer” é mais dita, e os tratamentos são discutidos por pacientes e famílias com um enorme apreço pela ciência, com a clara percepção de que estamos andando rápido em direção correta.
Não estamos mais à deriva. Dito isto, é justo e necessário confirmar que a mortalidade proporcional por câncer reduziu expressivamente, e melhor, continua em queda. Entretanto, o número de casos novos continua crescendo expressivamente – e é aí que temos uma bela oportunidade.
São múltiplos os fatores que levam uma pessoa ao câncer. Entre eles estão questões genéticas, ambientais, sociais e individuais. Boas escolhas realizadas todos os dias carregam a possibilidade de uma vida mais longa e saudável.
Precisamos falar disso. Precisamos assumir as responsabilidades individuais, compreendendo que nossas escolhas podem reduzir em mais de 50% o risco de desenvolver câncer.
A Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (Iarc) divulgou recentemente uma estimativa de mais de 35,3 milhões de novos casos de câncer em 2050, um aumento de 77% em relação à estimativa feita pela própria agência em 2022, que era de 20 milhões.
A previsão para o Brasil é de 1,15 milhão de novos casos. A mesma Iarc, em outro estudo, aponta que 1,9 milhão de óbitos ocorreram em 2020 em função de tumores causados por quatro fatores evitáveis – infecções pelo HPV, abuso do consumo de álcool, o tabagismo e obesidade.
O levantamento considera sete países, incluindo o Brasil, que representam mais da metade do número global de mortes causadas pelo câncer.
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Estudos epidemiológicos destacam que hábitos saudáveis, como uma dieta balanceada e a prática regular de exercícios físicos, também desempenham um papel fundamental na redução do risco de diversos tipos de câncer.
A redução do consumo de carne vermelha e embutidos, por exemplo, está associada a uma diminuição do risco de câncer colorretal, enquanto a cessação do tabagismo não apenas afasta o câncer de pulmão, como o de boca, garganta e esôfago, entre outros.
Aliás, uma boa notícia: estudos têm demonstrado que, após parar de fumar, o risco de câncer diminui progressivamente ao longo do tempo, ressaltando a importância de programas de cessação do tabagismo e apoio contínuo para aqueles que desejam abandonar esse hábito nocivo.
Exames periódicos como a colonoscopia e o Papanicolau são amplamente recomendados para a detecção precoce de lesões pré-cancerosas ou cânceres em estágios iniciais, aumentando assim as chances de tratamento bem-sucedido. A colonoscopia, por exemplo, é eficaz na identificação e remoção de pólipos no cólon, que podem se tornar cancerosos se não forem tratados.
No que diz respeito às vacinas, a imunização contra o HPV se mostra uma medida preventiva eficaz na redução do risco de cânceres relacionados a esse vírus, como o de colo do útero, vulva, vagina, ânus, pênis, boca e garganta. Estudos demonstraram uma diminuição significativa da incidência desses cânceres em populações vacinadas.
Não é novidade que existe uma correlação direta entre o consumo de álcool e o aumento do risco de diversos tipos de câncer, incluindo câncer de fígado, mama, esôfago, boca e garganta. Durante a pandemia, houve um aumento preocupante no consumo de álcool, o que pode contribuir para um aumento futuro nos casos de câncer.
É crucial destacar que a responsabilidade individual desempenha um papel fundamental na prevenção do câncer. Ao adotar hábitos saudáveis, realizar exames preventivos e seguir as orientações médicas, os indivíduos podem reduzir significativamente o risco de câncer e contribuir para a promoção da saúde pública.
Se entre as causas de câncer existem fatores que podemos controlar, é fundamental aproveitar essas oportunidades diárias em nossas vidas.
*Gustavo Fernandes é oncologista e Diretor da Dasa Oncologia