A doença renal crônica é um sério problema de saúde pública. Estima-se que 850 milhões de pessoas no mundo sejam portadoras dessa condição. Essa cifra representa aproximadamente 10% da população global.
A condição é definida como a presença de anormalidades nas funções renais. A saber, a principal função dos rins é a eliminação de toxinas a partir da filtragem do sangue. Além disso, eles produzem hormônios e controlam a quantidade de líquidos no organismo.
Em alguns casos, essas anormalidades podem evoluir até exigirem um transplante renal ou a realização de hemodiálise. Mais recentemente, um medicamento foi adicionado ao arsenal de tratamento do problema.
Trata-se da empagliflozina, molécula já utilizada no tratamento da diabetes tipo 2 e insuficiência cardíaca. Em maio, ela foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para doença renal crônica.
A aprovação veio após a publicação do EMPA-KIDNEY, publicado no periódico New England Journal of Medicine, que trouxe boas notícias para pacientes com doença renal crônica. Os pesquisadores demonstraram que o uso da medicação reduz o risco de progressão da doença renal ou morte cardiovascular em pacientes com doença renal crônica comparado a placebo.
Nesse estudo, 6.609 pacientes já com diagnóstico de doença renal crônica foram aleatoriamente divididos para receberem empagliflozina ou placebo em adição às demais medicações previamente em uso. No acompanhamento dos pacientes por dois anos, 16,9% dos que receberam placebo apresentaram progressão da doença renal ou óbito de causa cardiovascular.
Já no grupo que recebeu a empagliflozina, esses desfechos ocorreram em 13,1% dos pacientes. Isso significa uma redução da progressão da doença renal ou de morte cardiovascular em 28% naqueles tratados com empagliflozina comparados aos pacientes que receberam placebo.
Sabe-se que pacientes com doença renal crônica apresentam um maior risco de desenvolver insuficiência cardíaca e vice-versa. A interligação entre coração e rim é conhecida como síndrome cardiorrenal. A empagliflozina, como já tinha demonstrado benefícios na doença cardíaca, mostra agora ter um benefício duplo, nos dois órgãos.
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Bases do tratamento da doença renal crônica
As últimas diretrizes internacionais de 2024 para o tratamento da doença renal crônica elencam como alicerce para o tratamento a mudança no estilo de vida, isto é, adesão a uma dieta saudável, prática de atividade física, cessação de tabagismo e controle de obesidade.
Em relação às medidas farmacológicas, as gliflozinas como a empagliflozina são a primeira linha de tratamento para atenuar a perda de função renal.
É importante alertar os profissionais de saúde sobre a dosagem de exame de creatinina no sangue e do exame de pesquisa de proteína na urina para rastreio da doença renal. Ainda, a conscientização da população sobre a importância da saúde dos rins pode mitigar o fardo imposto pela doença renal no sistema de saúde e na sociedade em geral.
A cardiologia nos apresenta um exemplo formidável de conscientização. Após anos de divulgação e campanhas educativas desde os anos 80, já faz parte do senso comum que colesterol alto é prejudicial à saúde pois se relaciona com risco de infarto e acidente vascular encefálico (derrame).
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Segundo o último Censo Brasileiro de Diálise da Sociedade Brasileira de Nefrologia, há 153 mil pessoas dependentes de diálise para sobreviver no país. Esse dado é alarmante, pois houve um aumento de aproximadamente 60% no número de pacientes dialíticos nos últimos 10 anos, apesar de a população brasileira ter crescido apenas 6% nesse mesmo período.
Por isso, é importante adotar uma abordagem multidisciplinar para o cuidado dos rins, reconhecendo a intrincada interação entre os sistemas cardiovascular, renal e metabólico. As descobertas do estudo EMPA-KIDNEY anunciam uma nova era no manejo da doença renal crônica, levando em conta esse equilíbrio, oferecendo esperança a milhões de pessoas em todo o mundo que enfrentam essa enfermidade.
* Thiago Reis, é nefrologista e transplantador renal